*Por Paulo Akiyama
A definição de família tornou a ser revista desde que em 5 de maio de 2011, o Supremo Tribunal Federal (STF), ao julgar a ADI 4.277 e a ADPF nº 132, da relatoria do ministro Ayres Brito, reconheceu a união homoafetiva como entidade familiar.
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Ao interpretar o artigo 1.723 do Código Civil, conforme a Constituição Federal, o STF garantiu aos parceiros homossexuais os mesmos direitos e deveres da união estável, entendida como sinônimo de família.
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Como tal decisão dispõe de efeito vinculante e eficácia contra todos, a inclusão das uniões homoafetivas no âmbito do Direito de Família não requer tratamento destacado. Portanto, em vez de se falar em "homem e mulher", a referência é feita a "duas pessoas".
Após estar sedimentado por efeito vinculante o reconhecimento de união de pessoas do mesmo sexo, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) editou a resolução de nº 175 no ano de 2013, que dispôs sobre a habilitação, celebração de casamento civil ou de conversão de união estável em casamento, entre pessoas do mesmo sexo.
A Lei 11.340, datada de 2006, batizada de Lei Maria da Penha, portanto cinco anos antes da decisão do STF em reconhecer a união estável entre pessoas do mesmo sexo, vem sendo interpretada de forma a não preservar somente a violência contra a mulher, mas sim como violência doméstica, sendo que vários doutrinadores defendem a aplicação desta lei em todas as situações de violência doméstica, pouco importando se a vitima é homem, mulher ou se a relação seja hétero, homo ou poliafetiva, sendo este posicionamento o mais adequado aos dias atuais.
Diante desta visão doutrinária, ainda não consolidada, mas aceita em vários julgados, principalmente considerando ser uma violência de gênero e que independe de orientação sexual, muitos casos foram remetidos ao juizado de violência doméstica e processado com base na Lei Maria da Penha.
Citamos ainda o art. 5º da Lei Maria da Penha (11.340/06):
"Art. 5º (…) II – no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa. (…)
Parágrafo único. As relações pessoais enunciadas neste artigo independem de orientação sexual." (BRASIL, 2006).
Assim, considerando que a Lei Maria da Penha explicitamente reconhece a proteção a toda e qualquer família por laços naturais, por afinidade ou por vontade, independentemente da orientação sexual, não se pode afastar a aplicação desta lei e muito menos negar a nova tendência da família baseada na afetividade, visto que, a convivência entre pessoas e pela reciprocidade de sentimentos deve seguir uma proteção isonômica.
Isto se reforça pelo princípio basilar do estado democrático de direito, a igualdade, devendo a Lei Maria da Penha ser aplicada em todas as situações de violência doméstica, pouco importando se a vitima é homem, mulher, relação hétero, homo ou poliafetiva.
Necessário se faz esclarecer o que é o sujeito ativo e o sujeito passivo do crime.
Diferentemente do que se pode imaginar, o sujeito ativo do crime é aquele que pratica a figura típica descrita em lei, ou de forma isolada ou conjunta, com outros sujeitos, ou seja, aquele que pratica o núcleo do crime (quem mata, provoca lesões corporais, subtrai etc) como também os participes que colaboram de alguma forma para a consumação da conduta típica (prática do crime).
O sujeito passivo do crime é aquele que é lesado ou ameaçado pela conduta criminosa, podendo inclusive haver mais do que um sujeito passivo do crime, desde que todos tenham sofrido com os atos criminosos do sujeito ativo.
Assim, podemos dizer que nos crimes domésticos tanto o homem como a mulher pode ser sujeito ativo. Porém, por ser originariamente a Lei Maria da Penha uma proteção da violência contra a mulher, nada impede que por analogia seja aplicada contra ela (mulher) caso seja agente ativo do crime.
Entendemos que a Lei 11.340/06 deve ser aplicada indistintamente a homens e mulheres, pois tal posição não leva em conta a essência da própria lei, que é combater a violência de gênero.
Assim em uma relação homoafetiva entre pessoas do sexo feminino, haverá no caso de crime de violência doméstica, uma mulher como sujeito ativo do crime e uma mulher como sujeito passivo do crime, portanto, pelo principio do estado democrático do direito de igualdade, aplica-se as medidas previstas na Lei Maria Penha contra a mulher sujeito ativo do crime.
O mesmo se entende nos casos de relação homoafetiva entre pessoas do sexo masculino, porque um homem não pode ser protegido pelo principio da igualdade de direitos?
Leda Maria Hermann esclarece que o artigo 5º da Lei Maria da Penha, tem objetivo conceitual ao desdobrar o conceito e determinar a abrangência da referida norma. Segundo a autora, diante a redação do parágrafo único do referido dispositivo legal, fica evidente que o sujeito ativo da relação possa ser alguém tanto do sexo feminino quanto do sexo masculino, desde que a agressão ocorra nos moldes dos incisos I, II e III do aludido dispositivo legal, ou seja, no âmbito doméstico, familiar ou intrafamiliar.
Maria Berenice Dias esclarece que "a Lei Maria da Penha, de modo expresso, enlaça ao conceito de família as uniões homoafetivas". Acrescenta que "o parágrafo único do art. 5º reitera que independem de orientação sexual todas as situações que configuram violência doméstica e familiar".
Chamamos a atenção dos leitores para que saibam que a Lei Maria da Penha não prevê apenas violência física, mas todo e qualquer tipo de violência, seja psicológica, física, moral, sexual ou até mesmo patrimonial.
Assim, vale dizer que a Lei Maria da Penha tem como verdadeiro objetivo prevenir, punir e erradicar a violência doméstica e familiar contra a mulher, não em razão do sexo, mas em virtude do gênero que é a violência doméstica, bem como dentro do principio de igualdade entre os sexos, cabível e necessária é a aplicação da Lei Maria da Penha aos crimes praticados contra os homens nas relações domésticas, visto que o que caracteriza a violência doméstica não é o sexo, mas a existência de uma relação familiar ou de afetividade entre pessoas envolvidas, desde que uma esteja vulnerável frente a outra, ainda partindo do principio da igualdade, com o reconhecimento em 2011 da união entre pessoas do mesmo sexo, a Lei Maria da Penha também se aplica aos casais homoafetivos.
*Paulo Eduardo Akiyama é formado em Economia e em Direito. É palestrante, autor de artigos, sócio do escritório Akiyama Advogados Associados e atua com ênfase no direito empresarial e direito de família.
Para mais informações acesse http://www.akiyamaadvogadosemsaopaulo.com.br/ ou ligue para (11) 3675-8600. E-mail: [email protected]