Em entrevista à agência de notícias Diadorim, o jornalista e ex-deputado federal Jean Wyllys fez várias reflexões a respeito da questão LGBT, algumas até pouco comum de serem ouvidas no ativismo, tais como menosprezo sofrido por gays dentro da comunidade LGBT, obrigatoriedade de fazer sexo com determinada identidade de gênero e o fato de que trans e negros, por exemplo, podem discriminar.
Um dos alvos foi a proliferação de identidades. "Eu vejo com muita preocupação essa inflação [de siglas no movimento LGBT] que nos divide. Até porque eu sou velho mesmo, tenho 46 anos e existem coisas que eu nem entendo. Por que os gays estão chamando agora 'gay' de 'yag'? De onde veio essa maluquice, né? De onde tiraram isso? Desde quando?", questiona.
E continua: "Ou então esse menosprezo porque você é um homem cis, gay… As identidades são forjadas nas suas complexidades, e há pessoas que são queer e outra pessoas que não são. Então por que você vai me atacar pela minha identidade de gênero? Que loucura é essa? Eu sempre lutei para que você tivesse a expressão da sua identidade de gênero, e por que agora você quer atacar a minha identidade de gênero?".
A defesa de Wyllys, que mora atualmente em Barcelona, é pela liberdade, inclusive sexual.
"Nós lutamos por muito tempo para libertar nossos desejos de normas. Eu lutei por muito tempo para não ser obrigado a namorar mulher, quando eu não queria namorar mulher; lutei muito tempo para poder expressar meu desejo homossexual, e por que agora alguém vai formatar meu desejo ou me obrigar de gostar sexualmente de uma identidade de gênero que eu não goste?".
Wyllys, que está em exílio na Europa desde que deixou o mandato em janeiro de 2019 após receber ameaças de morte a ele e a sua família, também abordou a ideia de que segmentos discriminados não possam discriminar, algo que na opinião dele não é realidade.
"A relação de poder é móvel. Um homem negro, oprimido do ponto de vista étnico-racial e da cor da pele, pode ser um opressor, do ponto de vista de gênero – ele pode bater na mulher, expulsar a filha trans de casa, bater no filho gay. Ou seja, não existe um homem negro em si mesmo", diz.
O jornalista prossegue: "A gente precisa olhar cada situação. As mulheres negras, de um ponto de vista geral, ocupam sim a base da pirâmide. Mas há muitas mulheres negras que espancam seus filhos gays, assim que elas percebem que eles são gays, porque elas têm uma formação evangélica, porque a identidade religiosa delas leva à reprodução de homofobia e da transfobia.'
Outro exemplo citado é do que pode ocorrer na identidade de gênero. "Há pessoas trans que, por transfobia internalizada, se tornam profundamente misóginas, com uma misoginia asquerosa contra mulheres cis. Então, assim, uma pessoa trans não tem um monopólio da virtude por ser uma pessoa trans, e ela não tem autoridade por ocupar esse lugar em si mesmo.
Lugar de fala como verdade absoluta é outro objeto de sua crítica.
"O lugar de enunciado é importante, mas o que está sendo enunciado precisa ser analisado. Eu vejo com muita preocupação, às vezes, as pessoas que querem dar autoridade ao seu conteúdo por causa do seu lugar de fala. Eu digo: 'Não. É um pensamento torto'."
"Eu não vou jamais ser cúmplice disso, e essa cumplicidade vem de um comportamento, sobretudo na internet, de enxame, em que as pessoas vão se infectando umas às outras - exatamente como o movimento das fake news –, e elas produzem o linchamento virtual, um ataque até levar a pessoa a se retratar publicamente ou a fazer autopunição pública. Existe essa humilhação, principalmente entre nós mesmos. Quer dizer, dentro dos próprios movimentos identitários se exige essa expiação pública, humilhação nas mídias sociais, para que você não siga sendo atacado e humilhado."