"Não sou homem. Não sou mulher. Sou travesti." A frase da cantora Linn da Quebrada marcou sua chegada ao reality show Big Brother Brasil 22, na quinta 20. Na internet, houve muitos aplausos, entretanto, a receptividade não foi irrestrita dentro do ativismo trans. Houve até crítica direta à postura da famosa.
Curta o Guia Gay Brasilia no Facebook
A psicóloga e ativista trans com 29 anos de atuação Beth Fernandes diz entender a identidade de Linn, mas que o efeito prático da fala dela é pernicioso.
"Ela traz discussão sobre a transgeneridade não-binária", afirmou ao Guia Gay. "Isso é lindo quando eu estou dando aula em pós-graduação, falando sobre a teoria. Mas, no senso comum, no campo político, dentro das relações sociais, não! Linn traz um embaraço na sociedade no que estamos há anos discutindo. Ela desconstrói um pouco nossa luta política. Desculpe dizer!"
"Como é que vou lutar agora pelo direito dia 29 de janeiro para que as travestis façam a retificação de gênero nos documentos se eu fizer o retrocesso que a Linn faz já que ela quer se afirmar fora da binaridade de gênero? Ela precisa sempre reafirmar que dentro das políticas públicas, construídas dentro da binariedade, devo ser tratada como mulher. Sou fã número 1 dela, artisticamente, mas politicamente ela não me ajudou."
Beth, com livros sobre transexualidade no currículo, vê reverberações negativas do "não ser homem nem ser mulher" até no que diz respeito ao uso do pronome.
"Ao você não estar dentro da ideia geral de gênero, masculino e feminino, cria-se a possibilidade de que, dentro do senso comum, repito, não se reconheça a travestilidade na binariedade, o que pode levar inclusive a falta de respeito no uso correto do gênero. Estamos, o movimento trans, discutindo e lutando há anos para o reconhecimento da travesti como mulher."
Tathiane Araujo, presidente da Rede Trans Brasil, um dos principais coletivos ativistas do segmento no País, localiza a identidade de Linn como minoritária.
"Respeito a opinião da Linn e já ouvi falas como a dela em 20 anos de militância e afirmo: são minoria. A maioria da nossa comunidade de travestis se sentem mulheres, são assediadas como, assassinadas como, questionadas como em frequência bem maior por, na cabeça ignorante machista, estarmos renunciando o espaço de macho, o ser superior social."
Uma das fundadoras do movimento trans organizado no Brasil, Jovanna Baby faz coro.
"As identidade travestis têm suas nuances. Ela se sente assim. Eu respeito o posicionamento político dela, porém me reconheço como mulher travesti."