Com critério frouxo, livro traz minibiografias de 50 LGBT

Obra de Débora Thomé tem edição caprichada e, mesmo sem rumo, é válida

Publicado em 30/08/2021
livro 50 lgbtq incriveis
João W. Nery, Rogéria e Pabllo Vittar fazem parte da lista que compõe a obra

Por Marcio Claesen

O que têm em comum a cantora Daniela Mercury, a atriz Rogéria e o senador Fabiano Contarato? Eles são brasileiros e integrantes da comunidade LGBT que se destacaram em suas áreas.

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Os três e outros 47 nomes são resenhados no livro 50 LGBTQ+ Incríveis, de Débora Thomé, lançado pela editora Galera Record.

Destinada ao público jovem, a obra escrita pela jornalista e cientista política pretende reconhecer a importância de quem deixou sua marca e também lutou pelos direitos arco-íris ou apenas existiu e, por meio da vida, forçou limites.

Dentre os retratados estão pioneiros, tais como o antropólogo e ativista Luiz Mott, o jornalista João do Rio, o escritor João W. Nery - primeiro homem trans a se submeter a cirurgia no Brasil - e a jogadora Tiffany Abreu, a primeira transexual em time feminino esportivo do País.

A escrita de Débora é leve e as informações de cada tópico são relevantes, ainda que o espaço seja curto. 

As ilustrações que acompanham cada homenageado foram feitas por artistas LGBT e, assim como toda edição, são bem feitas.

O pesquisador Richarlls Martins, que organiza a publicação, salienta que houve preocupação em fazer uma interssecionalidade, como racial e religiosa, e "tantos outros atravessamentos que nos constroem".

Está aí uma potencial qualidade, mas também o maior defeito do livro. O critério da escolha é frouxo. Não é histórico, não é artístico, não é de relevância, não é de vivência, não é de quem desbravou. Em nome da mistura, sacrificou-se a consistência.

Para listar nomes pouco conhecidos do grande público, mas que têm ou tiveram influência em seus segmentos, foram deixadas de fora pessoas nacionalmente relevantes.

Por um lado, são lembrados a rapper Katú Mirim (para representar os indígenas), Leandro Prior (militares), Amiel Modesto (intersexos), Alexandra Gurgel (gordos), Alexya Salvador (evangélicos), Anahí Guedes de Mello (PCD) e Jurema Werneck (negros).

Por outro, isso fez com que Marina Lima e Ana Carolina, duas cantoras que em seus tempos foram desbravadoras e são até hoje musas das lésbicas, ficassem de fora.

E como não citar Clodovil Hernandez, primeiro deputado gay eleito no Brasil e um dos maiores nomes da moda do País? Ou Renato Russo, considerado um dos grandes letristas da música brasileira de todos os tempos? 

Ausentes também estão Katia Tapety, a primeira política transexual do Brasil, eleita há 29 anos como vereadora no Piauí; e Cassandra Rios, primeira escritora brasileira a vender 1 milhão de livros, a autora mais censurada pela ditadura, uma lésbica precursora no País.

Produto cultural mais exportado pelo Brasil, as novelas também mereceriam ser representadas. Ao menos um de quatro autores assumidamente gays ou bissexuais e de grande expressão poderiam ser citados: Gilberto Braga, Walcyr Carrasco, João Emanuel Carneiro e, principalmente, Aguinaldo Silva, que, além de assinar alguns dos maiores sucessos da teledramaturgia nacional foi cocriador e editor do primeiro jornal gay de grande circulação do País, o Lampião da Esquina.

A ciência de que a obra oferece essa salada arco-íris e um uso histriônico de linguagem não-binária é o caminho para, ainda assim, poder ter o livro na mesa de centro e honrar algo tão importante: reconhecimento de quem, dentre LGBT, fizeram e fazem história (ou não).

 

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